quinta-feira, 30 de setembro de 2010

"A Ilha"

"O velho anão já não tinha forças para acompanhar as rápidas corridas do jovem príncipe. Principalmente depois de lhe ter contado pela enésima vez a história dos seus pais.


- Anda, porque esperas? – perguntou o jovem, olhando para trás.

- Meu príncipe, tem que me dar um desconto. Eu não consigo acompanhar o seu ritmo. Já estou velho para estas caminhadas.

- Vamos, eu dou-te uma ajuda. – respondeu-lhe o príncipe, pegando no anão e empoleirando-o nas suas costas, encaixado entre as suas enormes asas e envolvido pelos seus longos cabelos negros como a noite estrelada."

"O Ancião que liderava a cerimónia elevou a voz, procurando chamar a atenção da multidão. Também ele dera pelo ruído e, tal como o rei e os aldeãos, não sabia do que se tratava, mas, fosse o que fosse, aquele casamento seguiria até ao fim e ele não deixaria que nada, mesmo nada, a interrompesse.

De repente, a alma de Freyja encheu-se de brilho, de um encantamento como nunca tivera, como se fosse rebentar. Não conseguiu controlar um sorriso e olhou para trás, segurando com força a mão do seu jovem rei.

Sabia que aquele ruído não lhe era estranho. Ali estavam eles, os seus amigos, os seus súbditos, o seu povo. Com as centenas de asas a baterem como nunca tinham batido, provocando uma suave brisa e um ruído que embalava as palavras das melopeias do coro."

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

"Dívida de Honra"

"E a carta do meu primo também não explica nada. Ele não sabe escrever muito bem… – o homem estendeu a carta a Renato, que cada vez percebia menos o que se estava a passar.


Olhou para Pedro, que mexeu o braço, agitando o jornal e a carta para que Renato lhes pegasse. Agarrou nos dois e, segurando a carta entre dois dedos, sacudiu o jornal. Percorreu a primeira página com os olhos, apressadamente, procurando algo que se referisse à sua vida na cidade, mas não encontrou nada. Apenas uma fotografia enorme, a ocupar quase a totalidade da página, de um ajuntamento de gente, aparentemente feliz, de braços no ar e sorrisos de orelha a orelha. No topo da imagem, podia ler-se a palavra Revolução."

"Dívida de Honra"

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

"A Ilha"

"Segundo os éditos, esta era quinta vez que o caso era levado ao rei, que se via assim compelido a tomar uma decisão drástica.


De facto, depois das tentativas que já fizera, só via uma solução: mandar os dois vizinhos a mudarem-se para lados opostos da aldeia. Caso não se mudassem, o rei recusar-se-ia a perder mais tempo com os dois teimosos.

Embora não estivesse contente com a sua decisão, era a única que lhe restava e sentia-se aliviado por encerrar aquele caso. E depois, precisava de concentrar todas as suas forças naquele estranho que aparecera na Ilha. Tinha que perceber qual o seu objectivo, se viera sozinho, se atrás dele viriam outros invasores. Caso o estranho tivesse vindo sozinho, a situação seria mais fácil. Só tinha que decidir se se devia dar a conhecer ou não. Se se tratasse de um homem de confiança, poderia até integrar-se na aldeia, no seu povo, ser um dos seus."

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

"Os Últimos a Sair"

"Os Últimos a Sair" in "Pequenas Histórias para Entreter"

"- E o que é que te diz a ti que a minha consciência fica descansada por saber que fiz algo para impedir um homem de cumprir o seu desejo?



- A sua vingança, queres tu dizer?


- Talvez seja mesmo uma vingança, mas eu não tenho direito de o impedir. Tal como ninguém teria o direito de me ter impedido.


- Não sentes sequer um leve arrependimento?"

"Os Últimos a Sair"



"Acho que nenhum de nós vai ser capaz de lhe explicar o que se passava ali… Aquilo tinha que ser vivido. Há um colega nosso que diz que entre isto e uma ida à sede da PIDE não havia diferença nenhuma. E ele sabia do que estava a falar, porque foi várias vezes à António Maria Cardoso. – Correia franziu o sobrolho."

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

What would you liked most to read next?

The story of a man who dies and accidentally ends up at the children's heaven?

or

The story of two brothers who get lost and end up in a village inhabited by two families who are not in speaking terms for more than 20 years?

O que é que gostavam mais de ler a seguir?

O que é que gostavam mais de ler a seguir?


A história de um homem que morre e, acidentalmente, vai parar ao céu das crianças?

ou

A história de dois irmãos que se perdem e acabam numa aldeia habitada apenas por duas famílias que não se falam há mais de 20 anos?

Qual o vosso preferido?

Qual é o vosso preferido? "A Ilha", "Dívida de Honra" ou "Pequenas Histórias para Entreter"?




"Largara tudo por um sonho, por aquele sonho que estava ali à sua frente.

Era pequeno, é certo, mas era seu. Também era deserto, mas esse era um dos seus objectivos.

Queria isolar-se, queria um sítio só seu. E conseguira." in "A Ilha"



"Aquela era, provavelmente, uma das regiões mais frias do planeta.

A floresta, as casas que rareavam, os poucos caminhos, mantinha-se tudo disfarçado pelo manto de neve durante cerca de nove meses, após o que se revelavam, timidamente, por algumas semanas." in "Dívida de Honra"



"A luxúria e a ambição tinham acabado com ele, embora a sua vida tivesse sido bastante longa para os padrões da época. Os homens daquele tempo, mesmo os senhores feudais, costumavam viver até aos 40 anos." in "O Cravo e a Sepultura", "Pequenas Histórias para Entreter"



Aqui ou no Facebook, através do grupo "Os Meus Livros - Luz de Lisboa http://www.facebook.com/topic.php?topic=184&uid=147661828589932#!/group.php?gid=147661828589932

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

"A Ilha"

"Este cenário de deserto gélido era reconfortante para Morten. A solidão, a certeza que não encontraria ninguém para lhe dizer isto ou aquilo, para o criticar, para o apontar, eram o garante do seu descanso.

Quando decidira mudar-se para a Ilha, muita gente lhe dissera que aquela solidão ser-lhe-ia agradável a princípio, mas que duraria para o resto da vida e que isso tornar-se-ia, provavelmente, insuportável.

Discordava completamente daquela visão.

A solidão nunca o assustara, pelo contrário."

"Morten tentou habituar os olhos à escuridão, mas era impossível distinguir o que quer que fosse.

De repente, percebeu. Exceptuando o vento que corria agora rapidamente lá fora, o silêncio era total. Adormecera embalado pelo consolador crepitar da lenha no fogo e este apagara-se. Acordara com a ausência desse ruído acolhedor.

Com alguma cautela, procurando evitar pisar as cinzas ainda quentes, Morten levantou-se e espreitou pela rudimentar chaminé.

Estava a amanhecer."

terça-feira, 7 de setembro de 2010

"A Mulher da sua Morte"

"A Mulher da sua Morte" in "Pequenas Histórias para Entreter"

"A Mulher da sua Morte"

"Bóris tinha a certeza que arranjaria sarilhos se fosse visto por ali àquela hora da noite, mas não conseguia deixar de lá voltar desde que se encontrara com aquela mulher pela primeira vez.


Sem perceber porquê, não fora capaz de lhe resistir. Sem qualquer explicação, o estranho toque dela, o cheiro que emanava e as suas carícias eram impossíveis de esquecer. E mesmo que o fossem, Bóris tinha sempre o pequeno golpe no ombro que ela lhe fizera. Por isso regressava todas as noites na esperança de a reencontrar."

domingo, 5 de setembro de 2010

http://castelodasandrix.wordpress.com/2010/09/05/favoritasfavs-3/

"Dívida de Honra"

"O seu último pensamento antes de adormecer foi para a idiotice de se preocupar com as olheiras, mas quando Aníbal acordou, a primeira coisa que fez foi certificar-se que estava com um aspecto mais descansado.


Quando se olhou ao espelho, pela primeira vez em muitos anos, Aníbal gostou de se ver. Sentia-se confiante e isso parecia reflectir-se no seu rosto.

Aquela imagem no espelho trouxe-lhe à memória um homem que já fora um rapaz cheio de certezas nas suas capacidades e que, sem perceber nem como, nem quando, nem porquê, perdera tudo.

Mas estava de volta. "

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

"As Luzes que Iluminam a Minha Vida"

http://castelodasandrix.wordpress.com/2010/09/03/the-lights-that-light-my-life-part-4-working-title/

"Cautelosamente, desloco a língua em redor da parte superior do peito dele e depois de saborear o suor agridoce que lhe brota de cada um dos poros, encontro uma protuberância demasiado rija para ser ignorada.


Pequena, arredondada e determinada. Esforça-se por amolecer, não quer dar nas vistas, mas não consegue."

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

"Os Últimos a Sair"

"Os Últimos a Sair" (in "Pequenas Histórias para Entreter")

"Os Últimos a Sair"
"- Não. – o PSP percebeu que a resposta era sincera e calou-se. Quando lhe tinham pedido que fosse buscar João para ajudar a polícia naquele caso, tivera a sensação que era uma decisão errada, um pedido que teria poucos ou nenhuns resultados práticos. Confiavam que João se arrependera do que fizera, depois de vários anos de cadeia, mas ele tinha a certeza que ele voltaria a proceder exactamente da mesma forma.



Quando chegaram junto ao edifício onde o homem se barricara, no centro de Lisboa, João sentiu um aperto no peito ao ver o aparato todo, a rua cortada ao trânsito, todos aqueles carros-patrulha, os polícias, os curiosos. Era tudo exactamente igual.


Os dois PSP saíram do carro e trancaram-no, dirigiram-se aos companheiros que tomavam conta da ocorrência. Pouco depois, o PSP que conduzira o carro voltou."