sábado, 19 de junho de 2010

Nunca o seu reino ficara sem um rei

"Nunca o seu reino ficara sem um rei, a necessidade de encontrar um herdeiro para o trono nunca se colocara ao seu povo.
Os destinos do seu reino estavam nas mãos da sua família desde tempos imemoráveis, sem que alguma vez isso tivesse sido posto em causa. Nunca ninguém o contestara e nunca haviam faltado herdeiros ao trono. Que ele soubesse, não existia sequer uma lei com a solução para o caso de não existir um futuro rei.
O povo tremera na sua ausência, mas a certeza que voltaria para casa era tal que não tinham sequer pensado em encontrar um substituto.
Poderia sempre assegurar o futuro escolhendo o seu sucessor entre um dos aldeãos, mas não fazia ideia de como o povo reagiria a tal decisão."


"Mas só agora percebia realmente o que significava chorar. Quando ouvira as descrições, achara que se tratava apenas de derramar lágrimas, mas compreendia agora o quanto lhe doía a alma, o corpo, a vontade que tinha de desatar a correr por esse mundo fora e gritar até aquela mágoa passar.
Precisava de ser abraçada, de ter alguém que lhe acariciasse o cabelo, que lhe garantisse que tudo ia ficar bem."

sábado, 12 de junho de 2010


"Com sorte, talvez eles fossem menos destemidos que os seus antecessores e acabassem por fugir do rei e do seu povo sem ser necessário recorrer a um conflito. Ou talvez não. Pelo que ouvira contar nas lendas, estes pareciam muito mais preparados para resistir à Ilha. De qualquer modo, não se apercebera de nenhum armamento. Talvez por pensarem que a Ilha era totalmente deserta, e por não acreditarem nas lendas, tivessem decidido que não eram necessárias armas.
Os dois homens despediram-se e partiram para junto do grupo, enquanto Morten se fingiu ocupado com as culturas, vigiando-os pelo canto do olho. De relance, olhou para o bosque, percebendo que o jovem rei observava tudo escondido entre algumas das árvores mais frondosas."


"Apesar da incerteza que sentiam quanto ao estado de Freyja, alguns momentos depois de estarem sentados na Praça de Armas, em frente a uma mesa coberta de delícias e respirando o ar fresco da noite, Morten sentiu-se tão descontraído que seria capaz de adormecer ali sentado. Na verdade, o cheiro da carne quente misturado com os aromas do bosque, o vento suave, o ruído das folhas e, lá ao longe, as vozes alegres dos aldeãos, festejando um rico repasto, faziam com que fosse capaz de viver ali o resto dos seus dias.
Os três permaneceram em silêncio durante muito tempo.
O anão juntou-se a eles para comer."



"O jovem rei deu um salto involuntário na cama, como se tivesse sido sacudido violentamente. Sentiu um forte aperto no peito e soltou um grito. Parecia ser a única forma de aliviar a aflição que o assaltava.
O anão entrou a correr. Acordara com o grito gutural do seu rei e estava assustado. Nunca o ouvira gritar daquela forma.
O jovem rei estava sentado na cama, coberto de suor como se tivesse acabado de sair de dentro de água, respirando de forma ofegante. Os seus olhos esbugalhados, o cabelo completamente escorrido, espalhado pelo tronco.
"

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Mais um bocadinho...




"No seu quarto, Freyja tentava controlar a ansiedade que a dominava. As vozes do povo reunido na Praça de Armas pareciam-lhe felizes, mas podia estar enganada. Sabia que o povo do jovem rei a aceitara como futura rainha, mas tivera sempre uma pequena dúvida e um grande medo sobre como reagiriam no dia do casamento. Afinal, era o dia da verdade, o dia após o qual já não poderiam voltar atrás. E isso poderia levá-los a mudar de opinião…
Queria espreitar para ver como estava a Praça de Armas, mas não queria ser vista.
O jovem rei bateu à porta do quarto, dizendo a Freyja que era altura de descerem.
Ela passou as pequenas e suaves mãos pelo vestido azul e sacudiu as asas, as mesmas asas que Morten tanto gostava. "

"Na cozinha, as mulheres começaram a ferver as infusões para banharem o corpo, mas tentavam manter o lume brando, esperando que o jovem rei chegasse. Nem sequer tinham conseguido perceber se ele queria realmente o corpo preparado a preceito.
O tempo pareceu demorar eternidades a passar mas, na realidade, pouco depois o rei chegou com as Velhas, contrariadas, assustadas e nada preparadas para arranjar um corpo de um humano.
O caminho até ao castelo havia sido feito em silêncio, embora as Velhas desejassem mais que tudo interrogar o seu jovem monarca. Mas ninguém tinha coragem. Ele parecera tão decidido…"

"Todos caminhavam com o rosto virado para o chão, embora o sentimento de alívio se revelasse, de quando em vez, num breve sorriso. Afinal, e apesar do sangue que manchava o chão, dos corpos caídos, dos coxos, dos manetas, dos cegos, afinal, tinham vencido a guerra contra os homens. Mais uma vez. E talvez fosse esta a última.
Fiydin começou a ajudar, mas sabia que deveria voltar ao seu mundo para explicar a Freyja o que se estava a passar com o seu amado.
Mas a tarefa de ajudar os feridos e de limpar a Praça de Armas revelou-se mais difícil e morosa do que aquilo que esperara e o tempo passou quase sem que desse por isso."